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Como é calculado o QI? Veja testes que buscam medir a inteligência
Publicado em 14.03.2013 10:31:44

Resolver problemas matemáticos cabeludos, persuadir uma multidão, arrematar uma partida de xadrez, compor peças musicais ou criar uma obra arquitetônica que vire referência. Não são tarefas impossíveis, mas o potencial de realizá-las aumenta conforme a pessoa demonstra ter uma inteligência em nível superior. Mas como medir algo tão subjetivo?

Diversos estudiosos já tentaram desvendar o que é a inteligência e se há maneiras de mensurá-la. A partir deles, vários modelos surgiram em um espaço de 100 anos, e talvez o mais conhecido deles seja o quociente de inteligência (QI). Contudo, embora haja inúmeros testes espalhados pela internet, verificar o indicador de inteligência não é tão simples, nem é feito despropositalmente, e requer acompanhamento profissional.

A definição de inteligência não é unânime. “Alguns teóricos supõem que a inteligência seja fator único. Outros entendem que há vários”, explica o professor do departamento de Psicologia do campus de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP) José Aparecido da Silva. Autor do livro Inteligência Humana: Abordagens Biológicas e Cognitivas, o professor defende a ideia de que há uma inteligência geral, mas há outras teorias que tateiam o terreno do que é inteligência, dividindo em duas ou mais variáveis. O QI, no entanto, foi um dos primeiros indicadores pensados para medir o intelecto individual.

A ideia de QI surgiu no início do século 20, graças aos trabalhos desenvolvidos pelo pedagogo e psicólogo francês Alfred Binet. Na época, observou-se que as crianças aprendiam em ritmos diferentes, e o especialista foi chamado para tentar propor uma solução, como programas especiais de educação. Com os testes desenvolvidos por Binet em conjunto com o psicólogo Théodore Simon, foi criada em 1905 a primeira escala de inteligência, conhecida como Binet-Simon. Mais tarde, em 1916, outro psicólogo, Lewis Terman, da Universidade de Stanford, aprimorou a medida, que passou a ser chamada de Stanford-Binet. “QI não é inteligência. É um indicador, um manifesto da inteligência que pode ser observado por meio dos testes”, ressalta Silva.

Inteligentes acima da média são apenas 2% A fórmula do QI é feita pela divisão da idade mental pela idade cronológica, sendo que esse número deve ser multiplicado por 100. Parece complicado, e na prática é difícil determinar a idade mental de uma pessoa. É para isso que servem os testes.

A professora do Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento da Universidade de Brasília (UnB) Denise de Souza Fleith afirma que as atividades propostas avaliam a capacidade de resolução de uma pessoa. Por isso, o nível das questões deve estar de acordo com a faixa etária de quem vai fazer o teste e com a cultura nacional ou local. “Não existe um teste que seja universal, que se aplique a qualquer idade. Alguns instrumentos podem ser inadequados”, alerta Denise. Teste de internet (mesmo os que são pagos), então, só por diversão.

A partir de uma normalização de resultados, o QI tem um valor médio estabelecido em 100. Desse número, estipula-se um desvio padrão de 15. Ou seja, a inteligência média está nos resultados que vão de 85 a 115. É nessa faixa que estão, aproximadamente, 90% da população (os brasileiros, por exemplo, tem uma média estimada em 87, segundo Silva). Abaixo desse valor, é sinal de que pode haver algum tipo de comprometimento intelectual. Acima, estão aqueles que possuem um desenvolvimento cognitivo mais avançado. Se o resultador der mais de 130, o indivíduo pode ser considerado um superdotado – ou um gênio. Mas eles representam apenas 2% de todo o mundo.

A aplicação dos testes geralmente tem um objetivo específico e não é feita de uma hora para outra. Sua realização geralmente busca um diagnóstico clínico para questões de comportamento e conduta, incapacidade cognitiva, problemas de desempenho ou retardo mental. Eles ainda podem ser úteis na hora de decidir pela aceleração ou não de um aluno – se ele está apto a pular de série ou entrar precocemente na escola ou universidade – e até em uma seleção de emprego. Mas a professora frisa que o QI não é a única ferramenta a que se recorre nesses casos: ele é apenas um dos subsídios para que a decisão seja tomada, ou para que o diagnóstico seja concluído. É por isso que a análise deve ser feita apenas por profissionais habilitados, como psicólogos, por exemplo.

Falta assistência para pessoas com altas habilidades No Brasil, a principal utilização dos testes de QI é no diagnóstico de déficit intelectual. Para essas pessoas, o País conta com rede de escolas especiais, sedes da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) e políticas de educação inclusiva (que nem por isso são totalmente eficientes). Mas o professor José Aparecido da Silva critica a preferência histórica dos governos em focar os investimentos, além da educação média, no ensino dos “excepcionais para baixo”. “No Brasil, pensam que o talentoso pode aprender sozinho, mas é ledo engano. Tal como a criança com QI baixo, aquelas que têm QI muito alto precisam ser ensinadas a usar esse talento”, observa.

Silva lamenta que os instrumentos sejam pouco utilizados para a busca de talentos. “O teste de QI é uma das principais ferramentas para identificar as pessoas criativas. São elas que fazem diferença”, defende Silva. Ele usa o exemplo de Santos Dumont, o pai da aviação, que tem QI estimado em 159 (não que ele tenha alguma vez se submetido a um teste, mas o valor é aproximado em função de seu legado), para destacar a importância de investir também nessa pequena parcela da população.

Hoje, o Ministério da Educação (MEC) informa que existem 27 Núcleos de Atividades de Altas Habilidades/Superdotação (NAAH/S), um para cada unidade federativa. Eles oferecem, no contraturno escolar, atividades que estimulem as aptidões e os temas de interesse dos alunos identificados com altas habilidades ou superdotação. Até 2014, o MEC espera implementar 42 mil salas desse tipo, atendendo 90% dos municípios brasileiros, como forma de fortalecer a articulação da educação especial com o ensino regular.

Uma ou múltiplas inteligências? A concepção de QI está longe de ser a única hipótese para a inteligência. Para alguns teóricos, esse indicador explica apenas uma parcela do intelecto humano. Quem está no time dos que propõem uma alternativa é o professor e psicólogo americano Howard Gardner, autor da Teoria das Inteligências Múltiplas, apresentada pela primeira vez em 1983.

Segundo Gardner, o ser humano possui não um, nem dois, mas nove tipos de inteligência, com personalidades e estudiosos que podem ser apontados como referência para cada uma delas: corporal-cinestésica (Pelé), espacial (Oscar Niemeyer), linguística (José Saramago), musical (Beethoven), lógico-matemática (Albert Einstein), interpessoal (Mahatma Gandhi), intrapessoal (Sigmund Freud), naturalista (Charles Darwin) e existencialista (Dalai Lama). Além dessas, especula-se a formulação de uma décima inteligência, a digital.

O professor José Aparecido da Silva, contudo, atenta para dois problemas da teoria de Gardner. O primeiro deles é que nem todos os tipos de inteligência definidos pelo americano podem ser medidos com testes objetivos. “Temos dificuldades em criar instrumentos para mensurar isso”, comenta.

Apenas três delas podem ser avaliadas: linguística, espacial e lógico-matemática. Mas aí vem o segundo problema. Na visão de Silva, essas três categorias estão fortemente correlacionadas, o que pode ser um empecilho à divisão. Em entrevista ao Terra, Gardner defendeu que a teoria pode ser um subsídio mais completo para entender a(s) inteligência(s) do que simplesmente efetuar o cálculo do QI.

“Se você acredita na Teoria das Inteligências Múltiplas, isso significa reconhecer que o QI cobre apenas algumas inteligências, a linguística e a lógica. É como um livro de receitas que só inclui carne, sem outros tipos de prato”, argumenta.

 

Cartola – Agência de Conteúdo – Especial para o Terra